Percepção dos pacientes com doença renal crônica sobre aplicativos mhealth
Perception of patients with chronic kidney disease about mhealth apps
Percepción de los pacientes con enfermedad renal crónica sobre las aplicaciones mhealth
DOI: 10.59681/2175-4411.v17.2025.1233
Kevin Vida Cabanelas
Escola de Enfermagem Anna Nery – Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ.
https://orcid.org/0000-0002-3779-2924
Silvia Teresa Carvalho de Araujo
Escola de Enfermagem Anna Nery – Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ.
https://orcid.org/0000-0002-2137-7830
Albert Lengruber de Azevedo
Universidade Federal de Roraima: Boa Vista.
https://orcid.org/0000-0003-2977-9946
Francisco Gleidson de Azevedo Gonçalves
Escola de Enfermagem Anna Nery – Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ.
https://orcid.org/0000-0002-6468-8137
Soraia do Socorro Furtado Bastos
Escola de Enfermagem Anna Nery – Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ.
https://orcid.org/0000-0002-1124-9456
Suely Francisco da Silva
Escola de Enfermagem Anna Nery – Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ.
https://orcid.org/0000-0002-7137-8970
Autor Correspondente: Kevin Vida Cabanelas
Artigo recebido: 07/09/2024 | Aprovado: 06/07/2025
RESUMO
Objetivos: Analisar a percepção de pacientes com doença renal crônica e seus familiares acerca de aplicativos mHealth. Métodos: Estudo qualitativo com análise de conteúdo de Bardin, realizado com 15 participantes (pacientes e familiares) de um serviço de nefrologia no Rio de Janeiro, através de entrevistas coletadas entre novembro de 2023 e janeiro de 2024. Resultados: A maioria dos participantes era casada (66,67%), católica (53,33%), com ensino até o fundamental (60%) e da classe econômica E (66,67%). Destacaram-se a necessidade de informações claras, suporte emocional (20%), comunicação eficaz (20%), orientações sobre dieta e suporte rápido em emergências (20%), além da fé como elemento crucial no tratamento (6,7%). Conclusão: O estudo conclui que os aplicativos mHealth desempenham um papel significativo na vida dos pacientes com doença renal crônica e seus familiares, facilitando a comunicação e o acesso a cuidados de saúde.
Descritores: insuficiência renal crônica; aplicativos móveis; comunicação em saúde.
ABSTRACT
To analyze the perceptions of patients with chronic kidney disease and their families regarding mHealth apps. Methods: A qualitative study with Bardin's content analysis was conducted with 15 participants (patients and family members) from a nephrology service in Rio de Janeiro, using interviews collected between November 2023 and January 2024. Results: Most participants were married (66.67%), Catholic (53.33%), with education up to primary level (60%), and from socioeconomic class E (66.67%). Key needs identified included clear information, emotional support, effective communication, dietary guidance, and quick emergency support, with faith being crucial in treatment. Conclusion: The study concludes that mHealth apps play a significant role in the lives of patients with chronic kidney disease and their families, facilitating communication and access to healthcare.
Descriptors: chronic kidney disease; mobile apps; health communication.
RESUMEN
Objetivos: Analizar la percepción de pacientes con enfermedad renal crónica y sus familiares acerca de las aplicaciones mHealth. Métodos: Estudio cualitativo con análisis de contenido de Bardin, realizado con 15 participantes (pacientes y familiares) de un servicio de nefrología en Rio de Janeiro, a través de entrevistas recogidas entre noviembre de 2023 y enero de 2024. Resultados: La mayoría de los participantes eran casados (66,67%), católicos (53,33%), con educación hasta nivel básico (60%) y de la clase socioeconómica E (66,67%). Se destacó la necesidad de información clara, apoyo emocional, comunicación eficaz, orientación sobre la dieta y apoyo rápido en emergencias, además de la fe como elemento crucial en el tratamiento. Conclusión: El estudio concluye que las aplicaciones mHealth desempeñan un papel significativo en la vida de los pacientes con enfermedad renal crónica y sus familiares, facilitando la comunicación y el acceso a la atención de salud.
Descriptores: insuficiencia renal crónica; aplicaciones móviles; comunicación en salud.
INTRODUÇÃO
Ao longo da história da saúde contemporânea, o processo de comunicação envolvendo pacientes, familiares e profissionais de saúde enfrentou vários desafios substanciais, muitas vezes devido a barreiras físicas, limitações de tempo e complexidades do sistema de saúde. No entanto, o aumento e a aceitação generalizada de smartphones, juntamente com a disponibilidade de aplicativos especializados em saúde, surgiram como um instrumento fundamental de apoio para superar esses desafios(1).
Ao utilizar aplicativos móveis e sistemas de registros eletrônicos de saúde, os profissionais são capazes de otimizar a eficiência e o tempo dedicado a cada paciente, permitindo acesso rápido a informações pertinentes e históricos de saúde abrangentes(2). Ademais, a tecnologia pode ainda capacitar os profissionais de saúde para oferecer cuidados centrados no paciente, promovendo interações mais profundas em um ciclo contínuo de cuidados(2).
Com isso, a tecnologia mHealth tem visto uma adoção crescente, particularmente após a emergência de saúde global desencadeada pela pandemia do coronavírus(3). Isso é evidente no monitoramento de indivíduos que enfrentam condições crônicas de saúde, como a Doença Renal Crônica - DRC, que podem se beneficiar substancialmente de tecnologias mHealth, como a telessaúde, que é reconhecida como uma alternativa para melhorar o acompanhamento de saúde de indivíduos, levando a uma redução notável nos custos e visitas hospitalares de emergência(4).
A DRC se configura como um problema de saúde pública e afeta 8% a 16% da população mundial, sendo uma doença de evolução lenta, progressiva e irreversível, podendo resultar em morte(4).
A abordagem ao paciente com DRC é essencialmente multidisciplinar, visando atender um controle equilibrado da dieta, farmacoterapia, atenuação de fatores de risco e promoção do autocuidado(5).
No entanto, pesquisas recentes têm mostrado que a utilização de instrumentos tecnológicos encontra barreiras, como por exemplo a diminuição gradual do uso e da popularidade do aplicativo por um longo período de tempo. Além disso, existe a necessidade de estratégias eficazes para reforçar a adesão à tecnologia e promover o engajamento ativo dos indivíduos que utilizam esses instrumentos tecnológicos(6). Além disso, há ainda as barreiras envolvendo a prática clínica, ética e normativa do uso destas tecnologias(7).
Portanto, realizar uma análise completa das perspectivas dos indivíduos em relação à utilização de aplicativos mHealth para monitorar e gerenciar os cuidados de saúde de pacientes com DRC é relevante. Isso tem um significado particular, uma vez que os resultados de pesquisas contemporâneas mostram que tais ferramentas tecnológicas têm o potencial de melhorar significativamente os resultados de saúde desse grupo específico de pacientes(8).
OBJETIVO
Analisar, sob a perspectiva biopsicossocioespiritual, a percepção de pacientes com doença renal crônica e seus familiares acerca da utilização de aplicativos de saúde.
ASPECTOS ÉTICOS
A aprovação do projeto foi concedida por dois comitês de ética: um afiliado à instituição proponente e outro à instituição coparticipante. As identidades dos participantes foram protegidas anonimizando-as. Duas cópias do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foram assinadas por todos os participantes, com uma cópia retida pelo participante e a outra pelo investigador principal. A elaboração e apresentação dos TCLEs foram realizadas de acordo com a Resolução 510/16 e a Carta Circular nº 1/2021-CONEP/SECNS/MS.
METODOLOGIA
Trata-se de uma pesquisa de campo qualitativa, utilizando a análise de conteúdo conceituada por Bardin. A seleção da metodologia foi baseada em sua capacidade de examinar minuciosamente as experiências, percepções e interações de indivíduos que enfrentam a doença renal crônica (DRC) e suas famílias, fornecendo uma compreensão abrangente dos fenômenos.
A estrutura analítica adotada neste estudo baseia-se em uma abordagem biopsicossocioespiritual, inspirada no referencial teórico de Viktor Frankl, que compreende o ser humano como uma totalidade integrada de dimensões biológica, psicológica, social e espiritual. Essa perspectiva possibilitou a organização das categorias emergentes de forma a refletir as experiências dos participantes diante do uso de tecnologias mHealth no contexto da doença renal crônica. Tal escolha permitiu interpretar os dados de modo coerente com os princípios da logoterapia, especialmente no que se refere à busca de sentido, à valorização da dimensão espiritual do sofrimento e à importância dos vínculos interpessoais, sobretudo os familiares, no enfrentamento da enfermidade.
CENÁRIO DA PESQUISA
A investigação foi realizada envolvendo 15 indivíduos, sendo 10 pessoas diagnosticadas com doença renal crônica e 5 familiares, internos do ambulatório de Nefrologia de um Hospital Universitário no Rio de Janeiro. Os critérios de elegibilidade incluem: ter 18 anos ou mais e receber tratamento para DRC, seja como paciente ou como familiar de um paciente em tratamento no serviço de nefrologia. O processo envolveu a utilização de um smartphone para fins de gravação, seguida pela transcrição e posterior análise dos dados coletados.
A fase de coleta de dados se estendeu do mês de novembro do ano de 2023 a janeiro do ano de 2024, durante a qual dois documentos distintos foram elaborados para facilitar o procedimento: a ficha de caracterização da amostra e um roteiro semiestruturado de entrevista com os participantes.
Instrumentos Utilizados:
Os participantes foram abordados e apresentados ao protótipo de aplicativo Nefro Digicare - um conceito de uma ferramenta mHealth idealizada pelo grupo de pesquisa Comunicação em Enfermagem Hospitalar Cliente de Alta Complexidade – CEHCAC, que tem como objetivo apoiar a comunicação entre pacientes com DRC, seus familiares e os profissionais de saúde que os assistem.
Na ficha de caracterização da amostra, as perguntas investigam aspectos como: sexo, idade, estado civil, religião, escolaridade, ocupação e renda.
O roteiro de entrevista semiestruturado compreende uma série de perguntas abertas categorizadas em três seções para uma exploração mais organizada e aprofundada do assunto:
Seção 1: Uso de Celular - Explora o uso de celulares e aplicativos, conhecimento tecnológico, experiências com saúde digital e teleconsultas.
Seção 2: Comunicação Enfermeiro-Paciente - Avalia a qualidade da comunicação com enfermeiros e técnicos, satisfação com cuidados, e sugestões de melhorias.
Seção 3: Aplicativo Nefro Digicare - Examina percepções sobre o protótipo do app, impacto na comunicação com a equipe, funcionalidades essenciais, sugestões de melhorias e design da interface.
Ao consentirem em participar, os participantes receberam o protótipo do aplicativo Nefro Digicare. Após a introdução do conceito, foi disponibilizado o formulário de caracterização da amostra e, após, iniciada a entrevista semiestruturada.
A duração média das entrevistas foi de 30 minutos cada e foi supervisionada pelo pesquisador principal, que possui formação em enfermagem, está cursando mestrado e recebeu instruções essenciais no desenvolvimento das técnicas de entrevista. Não foi definido volume de entrevistas, sendo elas conduzidas até a saturação teórica dos dados(9), que foi percebida na 13ª entrevista, quando elas passaram a apresentar recorrência de temas, sem o surgimento de novas categorias relevantes à pergunta de pesquisa. Após isso, foram realizadas duas novas entrevistas e, então, decidido por encerrar a coleta, constatando-se que os relatos dos participantes estavam suficientemente densos e variados, permitindo uma análise coerente com os objetivos do estudo.
As entrevistas foram codificadas com a identidade do participante anonimizada, sendo substituída por nomes de pedras preciosas (Opala, Rubi, Diamante…)
A metodologia proposta por Bardin foi utilizada para análise dos dados. Essa abordagem permite um exame qualitativo dos dados, facilitando o reconhecimento de padrões e temas repetitivos. Inicialmente, os dados foram organizados e transcritos para garantir a precisão das informações coletadas. Posteriormente, uma leitura abrangente do material foi conduzida, estabelecendo familiaridade e uma compreensão geral do conteúdo(10).
ANÁLISE DOS DADOS
A amostra do estudo foi composta por 15 participantes, distribuídos entre 08 (N=53,3%) do sexo feminino e 07 (N=46,7%) do sexo masculino. No que se refere ao tipo de participante, a amostra incluiu 09 (N=60%) pacientes e 06 (N=40%) familiares. Em relação ao estado civil, a maioria dos participantes eram casados (10, N=66,7%), enquanto 03 (N=20%) eram solteiros e 02 (N=13,3%) eram divorciados.
Em relação à filiação religiosa, a amostra apresentou uma maioria de católicos (08, N= 53,3%), seguidos por protestantes (06, N= 40%) e um participante espírita (01, N= 6,7%). Os níveis de educação variaram desde a conclusão do ensino fundamental, representado por 09 (N= 60%) participantes, até a conclusão do ensino superior, com apenas 01 (N= 6,7%), até 05 (N= 33,3%) participantes com ensino médio concluído.
Em relação ao nível socioeconômico, a maioria dos participantes (10, N= 66,7%) se enquadram na classe E (até 2 salários mínimos), sendo 03 (N= 20%) da classe C (de 4 a 10 salários mínimos) e 02 (N= 13,3%) da classe D (de 2 a 4 salários mínimos).
Figura 1 – Distribuição dos participantes quantos a sua caracterização
Os dados das entrevistas foram organizados, conforme figura 2, em quatro dimensões: Biológico, Psicológico, Sociológico e Espiritual.
Figura 2 – Dimensões e Temas Identificados na Análise de Conteúdo Temática
Figura 3 – Relações entre Participantes e Temas Identificados na Análise de Conteúdo
RESULTADOS
Na análise dos dados, a dimensão sociológica emergiu como o mais prevalente (N=100%), ressaltando a importância dos engajamentos sociais e do apoio familiar durante todo o processo de comunicação para os indivíduos; seguidos pelos marcadores Psicológicos (N=33,33%), Biológicos (N=26,67%) e Espiritual (6,67%)
Marcadores Sociológicos
As narrativas foram categorizadas em vários temas, destacando-se a Participação da família durante o tratamento (20%), que era frequentemente citado como uma fonte importante da assistência, consolo e reforço emocional.
A participante Diamante afirmou que “[...] a família tem um processo muito importante, muito cuidado[...]”.
[...] Isso aqui também é muito importante para o acompanhante, que às vezes pensa, se você “afundas”, é importante deixar ciente o enfermeiro. É familiar. A família tem um processo muito importante, muito cuidado. (Diamante)
Granada e Ágata também enfatizaram o papel do ambiente familiar no bem-estar do paciente, enfatizando a necessidade de proximidade e atenção para lidar com a doença.
[...] Sempre que temos oportunidade de estar juntos em família a gente se encontra e tenta aproveitar o máximo. Eu acho que é importante pra pessoa se sentir bem e não ficar pensando só na doença. (Granada)
Outro assunto foi a Repercussões da hospitalização (6,67%), no qual um participante relatou brincadeiras inapropriadas durante a internação. Opala discutiu o mal-estar decorrente de comentários insensíveis:
[...] Minha mãe hoje fez uma brincadeira no grupo, ah cara porque você está no hospital sem pagar conta, deitado o tempo todo, descansando, recebendo as coisas na mão e ainda acha que está ruim. Isso não é brincadeira né? [...] (Opala)
Participantes como Topázio e Rubi expressaram a necessidade de informações e assistência no manejo da doença, bem como a busca por esclarecimentos sobre questões relacionadas à saúde para Garantia de bem-estar e qualidade de vida(73,33%).
[...] Imagina se estou em casa e do nada eu sinto alguma coisa e tenho que sair correndo para o hospital. Seria perfeito poder me comunicar com alguém antes [...] ligar para uma pessoa, para um enfermeiro, um técnico de enfermagem, alguém que possa me auxiliar, me orientar, ainda mais com esse problema de saúde que eu tenho. (Topázio)
A temática Desconhecimento da família sobre hábitos alimentares (13,33%) também foi abordada, com participantes como Esmeralda e Água-Marinha destacando, respectivamente, as ocasiões de uso de aplicativos móveis para comunicação com a equipe assistencial, e como as funcionalidades do app Nefro Digicare poderia apoiar nas dúvidas sobre alimentação.
[...] Tem coisas que uns médicos dizem que eles podiam comer e outros não. Então aí fica difícil. E muitos alimentos e aí a gente fica com aquele medo, aquele medo de dar para comer e fazer mal, entendeu? Então nessa questão assim que às vezes eu me comunicava (com a equipe de saúde). (Esmeralda)
[...] Eu acho que nesse ponto (das dúvidas alimentares) o aplicativo... Nesse ponto eu vou levar, porque eu posso perguntar uma dúvida de última hora. Lentilha, pode? A equipe já atende [...] (Água-marinha)
Marcadores Psicológicos
A Comunicação eficaz entre equipe de saúde, clientes e familiares (26,67%) foi identificada como um elemento essencial para a saúde integral e o bem-estar holístico dos pacientes.
Os participantes destacaram a importância das funcionalidades apresentadas no protótipo do Nefro Digicare, para entender o estado emocional e físico do paciente. Esmeralda afirmou: "[...] Eu acho ótimo [...] entender como ele está no momento, se está bem ou mal. Acho isso muito importante. Gostei muito do aplicativo."
Topázio expressou a necessidade de paciência e amor, observando que: “Muitos enfermeiros encaram o paciente como um problema, é difícil. Uma pessoa doente é complicada. Mas é porque quando estamos doentes, parecemos ficar mais frágeis, tudo se torna mais difícil, o medo de morrer, tantas preocupações. Então, precisamos de mais paciência, mais amor nesse momento. É assim que eu penso [...]”
Outro tema relevante foi o Impacto psicológico da hospitalização (20%). Os participantes relataram desgaste psicológico e perda de paciência pela permanência hospitalar. A participante Rubi mencionou: “A parte mental, psicológica, fica meio... Às vezes, a gente se sente mais estressado, não é? Qualquer coisa já nos irrita. Além disso, é muito tempo, não é mesmo? Já são 46 dias aqui, então é natural começar a perder um pouco a paciência.”
Marcadores Biológicos
A necessidade de apoio para Lidar com situações de urgência (20%) foi citado. Os participantes mencionaram a importância de um aplicativo móvel que possibilita ter acesso rápido a suporte de saúde e informações, especialmente durante episódios críticos. Topázio descreveu uma experiência de urgência durante a hemodiálise: "Ontem tive um ataque de pânico durante a hemodiálise. Fiquei muito mal, mas as enfermeiras me atenderam rapidamente, me deram medicação e consegui controlar para terminar o procedimento. Às vezes, tem alguém disponível, mas à noite, por exemplo, não."
“Achei interessante [...] Às vezes, só preciso fazer uma pergunta, tirar algumas dúvidas, se surgir um probleminha, tipo 'estou me sentindo mal, algo está diferente', ter como pedir uma ajuda no aplicativo para não ter que ir ao hospital.” (Ametista)
Marcadores Espirituais
A participante Pérola destacou a relevância da sua religiosidade como suporte para desenvolvimento da fé. A Fé como busca pela cura (6,67%), fomentada pela crença religiosa, emerge como uma forma de enfrentamento da doença. Pérola expressou como a fé atua como um complemento ao tratamento medicamentoso: "A religião gera fé e a gente precisa ter fé pra essas coisas, pra melhorar e que a cura, talvez, porque também tem a cura né? A pessoa tem que crer, orar, fazer a sua parte, se cuidar, porque tem coisas que não é só o remédio, mas é Deus" (Pérola).
DISCUSSÃO
Com base nos dados, a tecnologia apresentada foi amplamente valorizada pelos participantes, destacando seu impacto positivo. De acordo com os participantes, a tecnologia pode trazer melhorias significativas ao pensar nas dimensões psicológicas, sociais, biológicas e espirituais, que facilitam a comunicação entre pacientes e profissionais de saúde, além de fornecer informações cruciais para o manejo da DRC. Observou-se, em particular, um interesse elevado pelos recursos que auxiliam na obtenção de informações sobre a condição de saúde e no oferecimento de apoio psicológico, evidenciando como a tecnologia pode atuar como uma ponte essencial no processo de saúde.
Os depoimentos dos participantes trouxeram percepções relevantes, especialmente em relação à falta de empatia no atendimento tradicional. Há depoimentos que a tecnologia, ao oferecer um canal de comunicação mais direto e acessível, pode contribuir para suprir essa lacuna, permitindo a expressão de preocupações e a obtenção de respostas de forma mais humanizada e acolhedora.
Ademais, o impacto psicológico e emocional do uso da tecnologia pode aliviar parte do desgaste emocional e da frustração associados à hospitalização prolongada. A capacidade de acessar informações de forma conveniente e de receber apoio através do aplicativo foram mencionados como fatores que podem contribuir para um melhor enfrentamento das dificuldades inerentes ao tratamento da doença renal crônica, considerando não apenas os aspectos clínicos, mas também os emocionais e espirituais no cuidado dos pacientes.
A espiritualidade surgiu como um marcador, com o relato do participante ressaltando o papel da fé e da esperança como elementos de esperança pela cura. O uso do aplicativo como um meio para expressar sua crença e busca pelo conforto espiritual indica que a tecnologia pode ter um papel complementar na personalização do atendimento aos pacientes em respeito da sua fé.
No contexto das conclusões a partir das entrevistas, é imperativo adotar uma perspectiva biopsicossocioespiritual para uma compreensão abrangente dos desafios enfrentados por indivíduos com doença renal crônica e suas famílias. Essa estratégia integralizadora reconhece que o bem-estar abrange não apenas o aspecto físico, mas também as dimensões psicológicas, sociais e espirituais(11).
Portanto, a importância da estrutura biopsicossocioespiritual reside em sua capacidade de abordar os diversos aspectos da condição humana, reconhecendo que intervenções de saúde eficazes precisam abranger todas essas dimensões(12). A utilização da tecnologia mHealth, exemplificada pelo protótipo de aplicativo avaliado na pesquisa, demonstrou seu potencial como um recurso valioso nesse contexto.
Desse modo, a presença da tecnologia digital emerge como um fator importante no desenvolvimento da comunicação com o paciente, desempenhando um papel crucial no processo de educação em saúde(13). A utilização do aplicativo como uma ferramenta de suporte e informação mostrou-se promissora para facilitar o entendimento dos pacientes sobre sua condição e os cuidados necessários. Isso empodera os pacientes, tornando-os mais informados e participativos em seu tratamento, potencialmente melhorando a adesão às recomendações de saúde e o manejo da doença, demonstrando que a educação em saúde pode ser significativamente enriquecida pela integração de soluções tecnológicas(13).
Em linhas gerais, as tecnologias mHealth oferecem uma ampla gama de funcionalidades que beneficiam tanto os pacientes quanto os sistemas de saúde. Elas estão disponíveis em diversas formas, como serviços de mensagens curtas (SMS), chamadas de voz, videoconferências, aplicativos móveis (apps), biosensores e dispositivos vestíveis (wearables). Essas tecnologias demonstram um potencial significativo para transformar a assistência à saúde, proporcionando uma comunicação mais eficiente, monitoramento contínuo e intervenções mais rápidas e precisas(14).
Limitações do Estudo
As limitações do presente estudo são a restrição dos participantes a uma única instituição de saúde, o que pode comprometer a generalização dos resultados. Tal característica limita a representatividade da amostra, uma vez que não abrange a diversidade de experiências e percepções de pacientes com doença renal crônica em diferentes contextos geográficos ou culturais.
Além disso, o perfil dos participantes, em sua maioria com menor escolaridade e inseridos em contextos de vulnerabilidade social, pode ter influenciado percepções específicas sobre o uso de tecnologias, especialmente quanto à familiaridade digital e à valorização de aspectos afetivos e espirituais do cuidado. Esse recorte reforça a importância de desenvolver soluções mHealth acessíveis e culturalmente sensíveis.
CONCLUSÃO
Este estudo evidencia o papel crucial das tecnologias de saúde na melhoria da qualidade de vida e no tratamento de pacientes com doença renal crônica. A partir da análise dos depoimentos dos participantes, observou-se que a adoção de um protótipo de aplicativo pode impactar significativamente de maneira positiva a comunicação entre pacientes, familiares e a equipe de saúde, promovendo um acompanhamento mais eficaz e um apoio integral. Os resultados destacam que a inclusão de recursos tecnológicos pode não apenas otimizar o monitoramento clínico, mas também proporcionar suporte psicossocial e espiritual, aspectos essenciais para o bem-estar dos pacientes. Assim, é fundamental que os profissionais de saúde e gestores estejam preparados para integrar essas tecnologias de forma eficiente e humanizada, reconhecendo sua importância como uma ferramenta complementar no cuidado integral e multidimensional dos pacientes.
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