Inibidores de checkpoint imunológico: eventos autoimunes e mineração de dados

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Immune checkpoint inhibitors: autoimmune events and data mining

Inhibidores de puntos de control inmunológico: eventos autoinmunes y minería de datos

DOI: 10.59681/2175-4411.v17.2025.1160

Natália Marmitt
Mestranda do Programa de Pós Graduação em Tecnologias da Informação e Gestão em Saúde. Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre - UFCSPA. Porto Alegre (RS), Brasil.
https://orcid.org/0000-0002-8935-8847

Sheron Tannara Vargas
Mestranda do Programa de Pós Graduação em Tecnologias da Informação e Gestão em Saúde. Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre - UFCSPA. Porto Alegre (RS), Brasil.
https://orcid.org/0000-0001-5558-6019

Agnes Peruzzo Innocente
Innocente Mestre em Ensino na Saúde. Enfermeira. Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Porto Alegre (RS), Brasil.
https://orcid.org/0000-0002-3560-3886

Diogo Ferreira Ducatti
Mestre em Ciências da Saúde. Enfermeiro. Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Porto Alegre (RS), Brasil.
https://orcid.org/0000-0002-6557-6428

Gabriel Ricardo Fernandes
Graduando em Gestão em Saúde. Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre - UFCSPA. Porto Alegre (RS), Brasil.
https://orcid.org/0009-0007-1172-3289

Alessandra Dahmer
Doutora em Ciências da Computação. Professora na Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre - UFCSPA. Porto Alegre (RS), Brasil.
https://orcid.org/0000-0003-4849-1315

Mellina da Silva Terres
Professora e atual Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Tecnologias da Informação e Gestão em Saúde da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre.
https://orcid.org/0000-0003-3923-3736

Autor Correspondente: Natália Marmitt

Artigo recebido: 20/01/2024 | Aprovado: 21/05/2025

RESUMO

Objetivo: Averiguar quais os eventos autoimunes relacionados ao uso dos inibidores de checkpoint imunológico foram descobertos através da mineração de dados (MD) evidenciados na literatura. Método: utilizou-se revisão rápida. As bases de dados pesquisadas foram Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Embase e Pubmed. Selecionaram-se 15 estudos para análise. Resultados: os eventos autoimunes mais comumente encontrados na literatura a partir da mineração de dados acerca do uso de inibidores de checkpoint imunológico foram: toxicidades renais, cutâneas, musculoesqueléticas, hematológicas, pulmonares, cardíacas e gastrointestinais, sendo alguns fatais. Conclusão: diversos eventos podem ocorrer com o uso da imunoterapia, reforçando a necessidade do acompanhamento individualizado. Sugere-se a investigação dessa terapia de acordo com o tipo tumoral, correlacionando com características demográficas, bem como o uso das tecnologias da informação para apoio aos profissionais de saúde.

Descritores: mineração de dados; imunoterapia; inibidores de checkpoint imunológico; neoplasias; efeitos colaterais e reações adversas relacionados a medicamentos; tecnologia biomédica.

ABCTRACT

Objective: To ascertain which autoimmune events related to the use of immune checkpoint inhibitors have been discovered through data mining (DM) from the literature. Method: A rapid review was used. The databases searched were the Virtual Health Library (VHL), Embase and Pubmed. Fifteen studies were selected for analysis. Results: the most common autoimmune events found in the literature from data mining on the use of immune checkpoint inhibitors were renal, skin, musculoskeletal, hematological, pulmonary, cardiac and gastrointestinal toxicities, some of which were fatal. Conclusion: various events can occur with the use of immunotherapy, reinforcing the need for individualized monitoring. It is suggested that this therapy be investigated according to tumor type, correlating with demographic characteristics, as well as the use of information technologies to support health professionals.

Descriptors: data mining; immunotherapy; immune checkpoint inhibitors; neoplasms, drug-related side effects and adverse reactions; biomedical technology.

RESUMEN

Objetivo: investigar qué acontecimientos autoinmunes relacionados con el uso de inhibidores de puntos de control inmunitarios se han descubierto mediante la extracción de datos (ED) de la bibliografía. Método: Se utilizó una revisión rápida. Las bases de datos consultadas fueron la Biblioteca Virtual de Salud (BVS), Embase y Pubmed. Se seleccionaron quince estudios para el análisis. Resultados: los acontecimientos autoinmunes más frecuentes encontrados en la literatura a partir de la minería de datos sobre el uso de inhibidores de puntos de control inmunitarios fueron toxicidades renales, cutáneas, musculoesqueléticas, hematológicas, pulmonares, cardiacas y gastrointestinales, algunas de ellas mortales. Conclusión: con el uso de la inmunoterapia pueden producirse diversos eventos, lo que refuerza la necesidad de un seguimiento individualizado. Se sugiere que esta terapia sea investigada de acuerdo con el tipo de tumor, correlacionando con las características demográficas, así como el uso de tecnologías de la información para apoyar a los profesionales de la salud.

Descriptores: minería de datos; inmunoterapia, inhibidores de puntos de control inmunológico; neoplasias, efectos colaterales y reacciones adversas relacionados con medicamentos; tecnología biomédica.

 

INTRODUÇÃO

Sabe-se que o sistema imune é capaz de reconhecer e controlar o crescimento tumoral, porém devido a sua capacidade limitada de filtragem e eliminação, o câncer ainda consegue se estabelecer no hospedeiro. Estudos mais recentes com medicamentos responsáveis pelo bloqueio de checkpoint imunológico, além de outras terapias, trouxeram uma nova era no tratamento do câncer(1).

A imunoterapia se divide em diferentes grupos, dentre as quais se encontram terapias de vírus oncolíticos, vacinas contra o câncer, terapias com citocinas, transferência de células e inibidores de checkpoints imunológicos(2). Esta atua estimulando a ação do sistema imunológico, de maneira que os mecanismos que protegem o corpo contra um ataque ao próprio organismo podem ser ineficazes ou interrompidos, ocasionando efeitos colaterais denominados efeitos adversos relacionados ao sistema imune ou eventos autoimunes ou imunomediados. Devido a eles, o tratamento pode ser descontinuado, causando impacto negativo no curso da doença, podendo apresentar, também, morbidade associada(1).

Apesar da crescente utilização da imunoterapia no tratamento oncológico, questões importantes relacionadas à farmacologia e biossegurança ainda são preocupantes, principalmente pelo fato de muitos mecanismos de ação destes medicamentos ainda serem desconhecidos, o que denota a importância de publicações sobre o assunto(3).

A tecnologia da informação disponibiliza ferramentas de busca para maior e melhor uso dos saberes já publicados(4). A exemplo do exposto, a técnica de mineração de dados é a mais eficaz alternativa para descobrir relações ocultas ou padrões, correlacionando informações, tornando a tomada de decisão mais assertiva, partindo da extração de conhecimento em grandes volumes de dados. Permite, ainda, a análise das informações, oportunizando o conhecimento de prevalências, incidências de enfermidades ou acontecimentos, permitindo a identificação de grupos mais vulneráveis a tais ocorrências(5). Esta técnica tem sua base fundamentada na inteligência artificial, e atua através de algoritmos e estratégias avançadas de aprendizado de máquina, podendo envolver problemas de regressão e classificação(5).

Tendo em vista esse cenário, o presente estudo buscou averiguar quais os eventos autoimunes relacionados ao uso dos inibidores de checkpoint imunológico descobertos através da mineração de dados evidenciados na literatura.

 

METODOLOGIA

Trata-se de uma revisão rápida de literatura, elaborada conforme o modelo proposto pelo Cochrane Rapid Reviews Methods Group(6). Através dela, é possível acelerar a obtenção e síntese de conhecimento, simplificando e otimizando métodos da revisão tradicional. Além disso, permite o agrupamento de evidências, auxiliando os serviços de saúde na tomada de decisões, respondendo a necessidades urgentes e emergentes(7).

Foram realizadas as seguintes etapas conforme sugerido pelo Cochrane Rapid Reviews Methods Group(6): 1) definição da questão de pesquisa; 2) definição dos critérios de elegibilidade; 3) realização da pesquisa; 4) seleção dos estudos; 5) extração de dados; 6) avaliação do risco de viés; 7) síntese.

A formulação da questão de pesquisa deu-se a partir do uso da estratégia PICO, que representa um acrônimo para Paciente/População/Problema, Intervenção, Comparação e “Outcomes” (desfecho) (8), onde a população (P) refere-se a pacientes tratados com inibidores de checkpoints imunológico, a intervenção (I) ao uso da técnica de mineração de dados, a comparação (C) não foi aplicada no estudo, visto que não ocorreu e o desfecho (O) representa os eventos autoimunes. Com essas informações, elaborou-se a seguinte questão norteadora: “Quais os eventos autoimunes relacionados ao uso dos inibidores de checkpoint imunológico descobertos através da mineração de dados evidenciados na literatura?”.

Foram estabelecidos os critérios de seleção, sendo incluídos estudos publicados na íntegra, de livre acesso, em português ou inglês e que contemplavam o uso da mineração de dados com inibidores de checkpoint imunológico. Foram excluídas revisões de literatura e literatura cinzenta (publicações não-convencionais).

A busca literária ocorreu no período de 01 de janeiro de 2018 a 01 de dezembro de 2023. As bases de dados eletrônicas consultadas foram: Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Embase e Pubmed. O acesso às bases para realizar a busca ocorreu em três momentos: 30 de agosto de 2022 e posteriormente em 10 de dezembro de 2023 e 25 de maio de 2025, a fim de atualizar o estudo. Foram usadas as respectivas strings de busca: (Data mining) AND (Immune Checkpoint inhibitors) AND (drug effects), (‘immune checkpoint inhibitor’/exp OR immune checkpoint blockerOR immune checkpoint inhibitorOR immune checkpoint inhibitors’) AND (‘data mining’/exp OR data miningOR datamining’) AND (‘adverse event’/exp OR adverse effectOR adverse effectsOR adverse eventOR adverse eventsOR adverse reaction’) e ((Data mining) AND (Immune Checkpoint Inhibitors)) and ((Reactions, Adverse Drug) OR (Drug Toxicity) OR (drug effects) OR (adverse effects) OR (Drug Related Side Effects and Adverse Reactions)).

Na base BVS foram encontrados 18 artigos, Embase 34 e Pubmed 16, totalizando 68 artigos. Os estudos foram, então, exportados para o website Rayyan(9), plataforma de livre acesso para organização de revisões, onde foram removidas as duplicatas (29). Dos artigos restantes (39), realizou-se a leitura para inclusão ou exclusão, segundo critérios pré-definidos. Após, o pesquisador 1 selecionou 15 artigos para leitura completa, enquanto o pesquisador 2 selecionou 16, sem que os pesquisadores estivessem a par das escolhas um do outro. Posteriormente, quebrou-se a blindagem das escolhas individuais e os autores realizaram discussão com o pesquisador 3 acerca dos estudos nos quais houve divergência de escolha, determinando sua inclusão ou não. Restaram, após as etapas acima, um total de 15 estudos que compuseram a atual pesquisa.

A qualidade metodológica e o viés de cada estudo foram avaliados usando a lista de verificação Downs e Black(10), sendo realizada por dois revisores de forma independente e, diante de divergências, houve a participação de um terceiro revisor. Os dados foram analisados em conjunto por todos os pesquisadores, que realizaram a síntese das informações encontradas e contraste com a literatura vigente, correlacionando com a possibilidade de utilização científica futura.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Dos quinze artigos analisados (Tabela 1), doze deles se deram exclusivamente na base de dados Food and Drug Adverse Event Reporting System (FAERS), enquanto um artigo usou essa base associada a EudraVigilance. Apenas um artigo utilizou a VigiBase como base de dados, assim como a Japanese Adverse Drug Event Report (JADER) foi utilizada para um único estudo. Nenhuma base de dados brasileira foi encontrada na presente pesquisa.

Tabela 1 – Artigos selecionados para revisão rápida

Autor/Ano

Título

Técnicas computacionais

DOI

Base Utilizada

Pundole, Sarangdhar, Suarez-Almazor(11).

2018

Rheumatic and musculoskeletal adverse events with immune checkpoint inhibitors: Data from the United States food and drug administration adverse event reporting system

Análise de múltiplas coortes através de uso de aplicativo AERS Mine®

10.4103/JIPO.JIPO_12_19

FAERS

Ji, Tang, Dong, Song, Jia(12).

2019

Adverse Event Profiles of Anti-CTLA-4 and Anti-PD-1 Monoclonal Antibodies Alone or in Combination: Analysis of Spontaneous Reports Submitted to

Análise de desproporcionalidade foi realizada por meio do cálculo das razões de chance de relato (ROR) com intervalos de confiança de 95% (IC).

10.1007/s40261-018-0735-0

 

FAERS

Fan, Hu, Yang, Zhao(13).

2019

Myocarditis following the use of different immune checkpoint inhibitor regimens: A real-world analysis of post-marketing surveillance data

Análise de desproporcionalidade e análise Bayesiana

10.1016/j.intimp.2019.105866

FAERS

Hasegawa, Ikesue, Nakao, Shimada, Mukai, Tanaka, et al(14).

2020

Analysis of immune-related adverse events caused by immune checkpoint inhibitors using the Japanese Adverse Drug Event Report database

Odds ratio (ROR) para avaliar a desproporcionalidade e regras de associação

10.1002/pds.5108

JADER

Chen, Qin, Fan, Zhao, Mercola, Li(15).

2020

Renal adverse effects following the use of different immune checkpoint inhibitor regimens: A real-world pharmacoepidemiology study of post-marketing surveillance data

Análise de desproporcionalidade e Bayesiana

10.1002/cam4.3198

FAERS

Bai, Lin, Zheng, Chen, Wu, Huang, et al(16).

2020

Mapping endocrine toxicity spectrum of immune checkpoint inhibitors: a disproportionality analysis using the WHO adverse drug reaction database, VigiBase

Análise de desproporcionalidade com componente de informação (IC) e razão de chances de relato (ROR)

10.1007/s12020-020-02355-9

 

VigiBase

Hu, Gong, Zhang, Li, Li, Zhao, et al(17).

2020

Colitis following the use of immune checkpoint inhibitors: A real-world analysis of spontaneous reports submitted to the FDA adverse event reporting system

Análise de desproporcionalidade, análise Bayesiana, incluindo a razão de chances de relatório (ROR), a razão de relatório proporcional (PRR), rede neural de propagação de confiança Bayesiana (BCPNN) e os algoritmos multi-item gamma Poisson shrinker (MGPS)

10.1016/j.intimp.2020.106601

 

FAERS

Chen, Wu, Zhang, Xu(18).

2021

Immune-related adverse events associated with immune checkpoint inhibitors: An updated comprehensive disproportionality analysis of the FDA adverse event reporting system

A análise de desproporcionalidade

10.1016/j.intimp.2021.107498

 

FAERS

Ma, Wang, Meng, Li, Zhang(19).

2021

Immune checkpoint inhibitors-related myocarditis in patients with cancer: an analysis of international spontaneous reporting systems

Análise de desproporcionalidade com componente de informação (IC), razão de chances de relato (ROR) e métodos Bayesianos

10.1186/s12885-020-07741-0

 

FAERS e EudraVigilance

Chen, Zhang, Jin, Wu, Xu(20).

2022

Sex differences in immune-related adverse events with immune checkpoint inhibitors: data mining of the FDA adverse event reporting system

Análise de desproporcionalidade e Bayesiana

10.1007/s11096-022-01395-7

 

FAERS

Chen, Zhang, Wu, Xu(21).

2022

Immune-related adverse events in older adults: Data mining of the FDA Adverse Event Reporting System

Análise de desproporcionalidade

10.1016/j.jgo.2022.05.009

FAERS

Zhang, Lao, Chen, Zhao, Du, Zhai, et al(22).

2022

Neuromuscular junction dysfunctions due to immune checkpoint inhibitors therapy: An analysis of FAERS data in the past 15 years - Event Reporting System database

Análise de desproporcionalidade Bayesianas

 10.3389/fimmu.2022.778635

FAERS

Liu, Chen, Zeng, Liu(23).

2023

Arrhythmic events associated with immune checkpoint inhibitors therapy: A real-world study based on the Food and Drug Administration Adverse

Análise de desproporcionalidade

10.1002/cam4.5438

FAERS

Shi H, He Y, Dan S, Yang L, Wang J, Chen L, Chen Z(24).

2024

Endocrine system-related adverse events associated with PD-1/PD-L1 inhibitors: data mining from the FDA adverse event reporting system.

Razão de chances (método ROR) e métodos padrão abrangentes (métodos MHRA)

10.3389/fmed.2024.1366691

FAERS

Lyu L, Bian S, Guan K, Zhao B(25).

2025

Eosinophil-induced adverse events induced by treatment with programmed cell death 1/ligand 1 inhibitors: A comprehensive disproportionality analysis of the FDA adverse event reporting system

Análise de desproporcionalidade e Bayesianas

10.1002/ijc.35398

 

FAERS

Fonte: Elaborado pelos próprios autores (2025).

A partir das leituras, evidenciou-se que análises através da MD são abordagens consolidadas e amplamente utilizadas nos estudos de farmacovigilância, sendo seu uso cada vez mais usual na área da saúde frente aos avanços terapêuticos na oncohematologia(22-25).

Alguns estudos trazem dados mais abrangentes sobre os eventos imunomediados decorrentes do tratamento com os bloqueadores de checkpoint imunológico, apresentando dados obtidos do Food and Drug Adverse Event Reporting System. Apontou-se que a maioria dos regimes de tratamento com essas drogas geram toxicidade pulmonar e sinais de toxicidade endócrina(14-16-19-24).

A mineração de dados apresenta a terapia combinada de Nivolumabe e Ipilimumabe ligada a eventos imunomediados em diversas categorias, bem como o uso de Ipilimumabe e Pembrolizumabe apresentaram associação estatística mais forte dos eventos imunorrelacionados associado ao uso da terapia com inibidores de checkpoint imunológico(14-15), corroborando com achados posteriores(18).

Chen et al. (2021)(18) e Shi et al. (2024)(24) mostraram que o Nivolumabe foi a droga com maiores índices de eventos adversos, seguida da terapia combinada de Ipilimumabe e Nivolumabe(18). A união de Ipilimumabe e Pembrolizumabe, por sua vez, apresentou associação estatística mais forte, bem como o menor tempo mediano para o início dos eventos. Ainda em relação ao tempo de ocorrência, Zhang et al. (2022)(22) citam início precoce dos sintomas neuromusculares na vigência de Pembrolizumabe e Nivolumabe. Já os eventos arrítmicos foram detectados imediatamente após o início do uso da terapêutica com tempo médio de 32 dias, diminuindo a média relatada anteriormente de 3,37 meses(23).

Apenas um estudo de Chen et al. (2021)(18) englobou o Tremelimumabe, porém não apresentou dados minerados, possivelmente devido ao início recente de tal terapia. Fatalidades pulmonares foram associadas ao Durvalumabe, enquanto toxicidades hematológicas foram encontradas em relação ao Avelumabe. Toxicidades renais e cutâneas, por sua vez, foram evidenciadas como mais presentes no uso de Cemiplimabe, enquanto o Pembrolizumabe apresentou a maior proporção de letalidade(18), já relatada anteriormente, porém relacionada ao Avelumabe(15).

Minerando dados da mesma base, Jain et al. (2021)(26) evidenciaram a colite como evento mais incidente, relacionado ao uso de Ipilimumabe, enquanto o Nivolumabe resultou em maior ocorrência de eventos arrítmicos e miocardite, sendo esse o efeito tóxico de maior letalidade(13-19).

A partir desse dado, Ma et al. (2021) (19) investigaram a miocardite, descobrindo a correlação entre pacientes do sexo masculino, em especial idosos. A analogia foi feita em uso de Nivolumabe e Avelumabe, onde o método odd ratio e de relações de relato proporcional foram mais altas na associação Avelumabe-miocardite e a intensidade do sinal detectada pelo método de redes neurais de propagação de confiança Bayesiana (BCPNN) se mostrou mais forte com o Ipilimumabe, concordando com outro Fan et al. (2019)(13), onde o Avelumabe apresentou associação superior com miocardite com base na maior razão de chances relatada.

O estudo apresentado por Fan et al. (2019)(13) que tratou exclusivamente sobre eventos arrítmicos decorrentes do uso de inibidores de checkpoint imunológico, apresenta associação significativa entre arritmia e medicamentos anti‐PD‐1 e anti‐PD‐L1, sendo a maioria em pacientes tratados com medicamentos anti-PD-1 (58,82%), especialmente Nivolumabe (39,13%).

Uma das análises realizadas é o método de análise ROR (relatório de chances de razão), o qual é caracterizado pela probabilidade de relato de um evento adverso causado por determinada medicação quando dividido pelas chances desse mesmo evento ser causado por todos os demais medicamentos em estudo(14). Assim, apesar de serem relatados com menor frequência (15,89%), os medicamentos anti-PD-L1 apresentaram sinais mais fortes pela análise ROR (ROR025 = 1,20), destacando-se o Avelumab (ROR025 = 1,43)(23), sendo tal achado consistente com o encontrado por Zhang et al. (2022)(22), bem como os dados relacionados a faixa etária e ao gênero, onde os pacientes mais propensos a eventos arrítmicos eram do sexo masculino e idosos(23-24-25). O uso de Ipilimumabe e Nivolumabe foi a terapia combinada mais comum associada a eventos imunomediados (14,81%)(23).

Chen et al. (2021)(21) alertam para a importância de estudos acerca do Cemiplimabe, uma vez que não possuem grande número de registros, provavelmente devido à recente chegada ao mercado. Em 2022, Zhang et al. (2022)(22) relatam um maior sinal de detecção em relação ao uso dessa droga e eventos neuromusculares.

A incidência dos eventos imunomediados, tais como eventos endócrinos, reumáticos, musculoesqueléticos, arrítmicos, miocardite, comprometimento renal e colite é majoritária no gênero masculino(13-15-17-19-20-21-23-24). A ocorrência elevada em pacientes acima de 65 anos também é observada(11-15-17-19-23-24). Em contraponto, Zhang et al. (2022)(22) evidenciou maior ocorrência de eventos neuromusculares no público feminino (59,96%), porém com idade média pouco acima de 70 anos, concordando com os achados relacionados à faixa etária.

Outro achado foi trazido por Lyu et al. (2025)(25) em relação à eosinofilia, apontada como evento mais comum relacionado à internação hospitalar. Além de internação prolongada, morte devido ao uso de inibidores de checkpoint imunológico foram atreladas a >10% dos casos em estudo de Shi et al. (2024)(24).

Acerca das toxicidades renais, o Avelumabe apresentou eventos fatais em três de três (100% dos casos)(15), sendo posteriormente evidenciada tal toxidade apenas em pessoas do sexo masculino(21), corroborando com os achados acima descritos.

As endocrinopatias foram apontadas, além de predominantes no sexo masculino, mais incidentes com Nivolumabe(16-24). Cita-se a união de drogas anti-CTLA-4 com drogas anti-PD-1/PD-L1 no aparecimento de tais toxicidades, estando fortemente associadas à hipofisite, tendo aparecimento regular quando em vigência de monoterapia anti-CTLA-4 (12 semanas), enquanto na monoterapia anti-PD1 se mostrou mais volátil, com variações de 0-48 semanas(16).

Alterações endócrinas são frequentes no uso de inibidores de checkpoint imunológico, destacando-se disfunção tireoidiana, diabetes mellitus tipo 1 e pneumonite no uso de Pembrolizumabe e Nivolumabe(12-16). Colite, hipofisite e insuficiência adrenal são mais frequentes com uso de Ipilimumabe, já erupção cutânea e hepatite apresentam taxas semelhantes com anti-PD- 1 e anti-CTLA-4(12).

Identificou-se a incidência de pneumonite predominantemente ao uso de Nivolumabe(14). Havendo, ainda, maior incidência de artralgia e mialgia, com alto número de reportes musculoesqueléticos em relação aos inibidores anti-PD-1(11).

Em análise mais aprofundada, foi revelada uma gama de toxicidades relacionadas especialmente aos idosos (ROR de 1,2 em relação a adultos jovens), dentre elas toxicidades cardiovasculares, musculoesqueléticas, do sistema nervoso, renais e toxicidades cutâneas(21). Faz-se o alerta(22) acerca dos eventos neuromusculares que, apesar de raros (0,63%), tiveram mortalidade associada (32,85%), reforçando a necessidade de um cuidado individualizado para detecção precoce, em especial para sintomas relacionados à Síndrome de Guillain-Barré.

CONCLUSÃO

Apesar dos benefícios compreendidos na imunoterapia, como melhores resultados clínicos, redução de efeitos colaterais e aumento de sobrevida, esta revisão revela que os eventos adversos imunomediados associados a tal terapêutica são diversos e podem afetar diferentes sistemas do corpo. Tais efeitos reforçam a necessidade de uma atenção constante por parte dos profissionais de saúde, especialmente ao cuidar de um público vulnerável, como os homens idosos, que parecem apresentar maior risco de desenvolver essas reações.

Observou-se, também, que as combinações de medicamentos, como Nivolumabe e Ipilimumabe, tendem a estar mais associadas a reações adversas que podem surgir de forma precoce, o que reforça a importância de um acompanhamento rigoroso logo nos primeiros momentos de tratamento. Com o avanço da medicina, surgem novas opções terapêuticas, como o Cemiplimabe, cuja segurança ainda precisa ser mais bem compreendida, destacando a relevância de estudos contínuos.

Frente ao exposto, a tecnologia da informação vem como aliada no cuidado à saúde, facilitando a identificação de gatilhos ou mesmo associações que possam predispor ao aparecimento de tais eventos. Sugerem-se estudos com a população brasileira e que englobam tal terapêutica correlacionando seu uso aos diferentes tipos de câncer e características demográficas, bem como o uso de diferentes abordagens da tecnologia da informação para obtenção, manejo e melhor aplicação dos conhecimentos gerados.

A partir da análise realizada, foi possível compilar dados de terapias e eventos imunomediados diferentes, num contexto de crescentes novas combinações medicamentosas para o tratamento do câncer. Além de um olhar abrangente sobre o tema, evidenciou-se o aumento de estudos com uso da inteligência artificial, representado aqui pela técnica de MD, para auxílio dos profissionais em realizar análise do montante de dados em saúde em prol do cuidado assertivo. Em suma, além do advento tecnológico, a vigilância constante, o cuidado individualizado e a escuta ativa às queixas dos pacientes são essenciais para garantir que os benefícios dessas terapias sejam alcançados com o menor risco possível.

REFERÊNCIAS

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